[visibilidade ou exibição]

Ariane Almeida
2 min readMar 28, 2021

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tenho suportado ainda menos o instagram. quis iniciar esse texto falando que meus olhos estão cansados de imagens tantas, mas pensando bem: acho que o enjoo é endereçado a essa plataforma específica. prova disso é que ainda assisto tv e, ainda que a use enquanto instrumento reprodutor de ruídos secundários ou talvez terciários aos meus pensamentos, de repente observo a tela sem tanta repulsa.

com uma frequência considerável penso na membrana delicada que separa a estética do esteticismo. até que ponto o que agrada a vista é de fato agradável? sedução, fixação, representação, obsessão – quantas vezes ultrapassamos o exterior da casca? a figura posta diante do público, o corpo exposto às luzes convergentes, gestos em planos, emoções em palcos, delineados daquilo que salta a própria existência.

nunca me foi simples a tarefa de me mostrar e por muito tempo não somente desejei como preferi estar por trás das evidências – desse modo resisti a ingressar instantaneamente em fotologs ou outras propostas semelhantes. nessa semana que passou revi fotografias antigas onde, já naquela época, preferi direcionar as lentes para campos que não me continham. refletindo bem sobre isso, sim, afirmo qualquer problema com meu reflexo, mas não, não é puramente esse ponto focal – especialmente agora, na vida como se apresenta em 2021, parece pouco relevante a face em pose. diga X e sorria, embora, no fundo, tudo – aparentemente tudo mesmo – se revele numa angústia desesperadora.

assim posiciono minhas câmeras a objetos, paisagens, combinações inusitadas ou cotidianas. nesse lugar encontro visões possíveis. às vezes preciso me encarar profundamente pelo espelho e o faço, reconheço a importância do ato, mas não me ponho em demasiado nessa perspectiva – certa vez colei nas costas de um desses de corpo todo uma nota que alertava sobre a distorção. difícil perceber a precisão daquilo que enxergamos, os tons variam de acordo com cada aparato ocular e algumas vezes nos resta admitir: concordamos em discordar.

antes que isso tudo pareça em torno de uma forma pessoal, deixo dito que sinalizo também os discursos. desde que o desenhou deixou, claramente aos olhos meus, de ser aquilo articulado em papel e lápis, me poupo um pouco da necessidade de explicar o porquê de projeções serem formadas por ideias. então a massificação! tudo é dimensão inalcançável, não aplicarei aqui a essência totalitária: a maior parte do que vejo no meu feed infinito se assemelha tanto que venho perdendo o interesse de quem encabeça a ordem, a geometria, a fonte e até a assimetria do que é publicizado. posso sugerir onde o material foi produzido, as leis (nem-tão) invisíveis que moldaram o que ali está. na superfície do volumoso conteúdo – fina camada, linha incompleta, vazio revestido em papel-presente.

ainda que a palavra seja corpo gráfico, nela (pelo menos nesse instante) tenho me visto com maior resolução. sinto falta das pessoas que põem em texto aquilo que incomoda na imagem – não me sinto bem vendo o número 3000 seguido do cenário paradisíaco acompanhado da negação da morte.

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